Sou um passageiro. Isto em bom português quer dizer: estou de passagem. Virá um dia em que caduque a minha validade. Só o comboio é perene, inextinguível. Por isso é uma gratuita crueldade a voz do altifalante dizer de vez em quando: -- Senhores passageiros, isto. -- Senhores passageiros, aquilo. Passageiro. Caramba, não preciso que mo lembrem. Não me enterrem mais a coroa de espinhos: já me está apertada, fundida com o crânio quanto baste. A. M. Pires Cabral QUE COMBOIO É ESTE, Edição Teatro de Vila Real, Dezembro de 2005