7.
Adonis: são remos os ciprestes?
Ou os pulmões de um louco?
O "barbeiro" que me içou a vela
no mastro das dores,
e me encheu a boca
de forragem destinada a animais,
não voltou a aparecer. Mas é
diabo a quem devo, tatuado
no sangue,
o genoma
destes versos de Hakim Sanai:
«Toda a existência é simplesmente
o vento a teu favor!»
António Cabrita
COMBATE DE FLAUTAS, & etc, Lisboa, Setembro de 2003
21.9.15
17.9.15
GÉNESE
Sozinho, à margem do caminho, um verme.
Passam, repassam bandos pela estrada.
E alguns vão vê-lo... ou antes: vêm ver-me,
Com um dó que dói como uma chicotada!
Passam, repassam bandos pela estrada...
Levantam pó que desce a envolver-me.
E outros, por animarem a jornada,
Jogam à bola com minh'alma inerme.
Passam. E à margem do caminho, triste,
Respiro o pó que inda no ar persiste...
Cai das estrelas o silêncio, o espanto.
Qualquer coisa de absurdo me sufoca.
Maior do que eu, sobe-me a alma à boca.
Falta-me o ar, incho de angústia... - E canto.
José Régio
Eugénio de Andrade, Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa, Campo das Letras Editores, S. A., 1999
Passam, repassam bandos pela estrada.
E alguns vão vê-lo... ou antes: vêm ver-me,
Com um dó que dói como uma chicotada!
Passam, repassam bandos pela estrada...
Levantam pó que desce a envolver-me.
E outros, por animarem a jornada,
Jogam à bola com minh'alma inerme.
Passam. E à margem do caminho, triste,
Respiro o pó que inda no ar persiste...
Cai das estrelas o silêncio, o espanto.
Qualquer coisa de absurdo me sufoca.
Maior do que eu, sobe-me a alma à boca.
Falta-me o ar, incho de angústia... - E canto.
José Régio
Eugénio de Andrade, Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa, Campo das Letras Editores, S. A., 1999
13.9.15
CARDIOGRAFIA
Para vos ver amigos
hoje ponho as minhas lentes
verde húmido de lágrima
hoje sois belos verticais mesmo gregos
vossas boas acções enumero
por límpidos dedos de água.
A raiva de muito vos querer
meu jasmim refractário foi
mas hoje que me suicido por vós
com a cálida tinta vos pinto
do meu terno olho de boi.
Natália Correia
O VINHO E A LIRA, Edição Fernando Ribeiro de Mello, Lisboa
10.9.15
Parábola sobre a utilidade das coisas
Não há espaço para poemas, nem retórica.
Jean-Claude Juncker
Inúteis os poemas, não há espaço;
inúteis os poemas, pois não salvam;
inúteis os poemas, não acabam
com as balsas e os muros e as fronteiras
e não dão de comer a quem tem fome
e não dão de beber a quem tem sede
e não passam rasteiras aos que tentam
fugir do sufoco e do arame
farpado que lhes tolhe os horizontes;
inúteis os poemas, não impedem
os naufrágios de milhares, sequer
as guerras de que tantos fogem aos milhões;
inúteis os poemas, não traficam
armas e mais armas e mais gente
e petróleo e petróleo e mais petróleo;
inúteis os poemas. Tão inúteis.
Úteis os discursos e as lágrimas
de velhos crocodilos.
© Domingos da Mota
Pequeno tratado das sombras, Edição Busílis, 2018
Jean-Claude Juncker
Inúteis os poemas, não há espaço;
inúteis os poemas, pois não salvam;
inúteis os poemas, não acabam
com as balsas e os muros e as fronteiras
e não dão de comer a quem tem fome
e não dão de beber a quem tem sede
e não passam rasteiras aos que tentam
fugir do sufoco e do arame
farpado que lhes tolhe os horizontes;
inúteis os poemas, não impedem
os naufrágios de milhares, sequer
as guerras de que tantos fogem aos milhões;
inúteis os poemas, não traficam
armas e mais armas e mais gente
e petróleo e petróleo e mais petróleo;
inúteis os poemas. Tão inúteis.
Úteis os discursos e as lágrimas
de velhos crocodilos.
© Domingos da Mota
Pequeno tratado das sombras, Edição Busílis, 2018
6.9.15
O Monólogo do Merceeiro
XXVI
Livro dos fiados é arte
o derradeiro
acha-se numa sacristia
à guarda das sombras
de Deus
e das moscas.
Ivo Machado
O MONÓLOGO DO MERCEEIRO, Insubmisso Rumor, Porto, setembro de 2015
Livro dos fiados é arte
o derradeiro
acha-se numa sacristia
à guarda das sombras
de Deus
e das moscas.
Ivo Machado
O MONÓLOGO DO MERCEEIRO, Insubmisso Rumor, Porto, setembro de 2015
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