Acerca da fragilidade
De uma criança
Nada diremos.
Acerca da sua força e das imagens
Nocturnas que se espelham
Como o adversário se espelha
Na polida solidez do escudo,
Sobre isso talvez nos seja dado
Dizer o que não merece mais
Do que síntese e remorso.
Luís Quintais
Eufeme, magazine de poesia, n.º 0 (julho/setembro de 2016) Edição e coordenação: Sérgio Ninguém
28.9.16
22.9.16
AO CONTRÁRIO DE ULISSES
Infeliz quem, ao contrário
de Ulisses, volte a casa
e nem sequer um cão, nem
um cão morto sequer, ladre.
Pedro Mexia
Menos por Menos, Publicações Dom Quixote, Lisboa, Abril de 2011
21.9.16
O CÃO DE ULISSES
(glosa ou quase)
Como pode um Poeta ser cego
(perguntava Lêdo Ivo)
se a Poesia é a arte de ver? Ele soube-o dormindo
ou acordado, e transpondo as pontes por Sevilha.
Árgus, o cão de Ulisses, confirmá-lo-ia
como fez com seu dono. Lêdo sabia-o.
E qualquer um dos seus vinte e dois cachorros
cuja privacidade sempre respeitou.
Como pode um Poeta ser cego
(perguntava Lêdo Ivo)
e Homero existido? Lêdo sabia-o. Como Borges
sempre soube, porém, não há notícia se o portenho
alguma vez teve cão. Por essa razão,
Lêdo escutou os latidos de todos os cachorros,
não fosse o caso de um (entre eles) ser o mito
-- O cão de Ulisses, o verdadeiro.
Ivo Machado
A CIDADE DESGOVERNADA, Insubmisso Rumor, Porto, Fevereiro de 2016
a Lêdo Ivo,
in memoriam
in memoriam
Como pode um Poeta ser cego
(perguntava Lêdo Ivo)
se a Poesia é a arte de ver? Ele soube-o dormindo
ou acordado, e transpondo as pontes por Sevilha.
Árgus, o cão de Ulisses, confirmá-lo-ia
como fez com seu dono. Lêdo sabia-o.
E qualquer um dos seus vinte e dois cachorros
cuja privacidade sempre respeitou.
Como pode um Poeta ser cego
(perguntava Lêdo Ivo)
e Homero existido? Lêdo sabia-o. Como Borges
sempre soube, porém, não há notícia se o portenho
alguma vez teve cão. Por essa razão,
Lêdo escutou os latidos de todos os cachorros,
não fosse o caso de um (entre eles) ser o mito
-- O cão de Ulisses, o verdadeiro.
Ivo Machado
A CIDADE DESGOVERNADA, Insubmisso Rumor, Porto, Fevereiro de 2016
20.9.16
O CÃO DE POMPEIA
O cão que vi prostrado na ferrugem do pêlo eriçado,
Não era osso a fugir, calcinado.
Mordiam-lhe as pulgas e o flash, mas estava vivo.
(Pelo menos a respiração tumefaz-se empoeirada.)
O chão seco em que caia o seu repouso.
Nada se parecia com a lava.
<Este cão, a vida que continua em Pompeia, que sempre continua.>
José Emílio-Nelson
BELEZA TOCADA OBRA POÉTICA 1979-2015, Abysmo, Lisboa, Setembro de 2016
Não era osso a fugir, calcinado.
Mordiam-lhe as pulgas e o flash, mas estava vivo.
(Pelo menos a respiração tumefaz-se empoeirada.)
O chão seco em que caia o seu repouso.
Nada se parecia com a lava.
<Este cão, a vida que continua em Pompeia, que sempre continua.>
José Emílio-Nelson
BELEZA TOCADA OBRA POÉTICA 1979-2015, Abysmo, Lisboa, Setembro de 2016
7.9.16
MADRIGAL
Aquela enorme frieza
Não entristeça ninguém...
Ela estende o seu desdém
À sua própria beleza:
Quando, solta do vestido,
Sai da frescura do banho,
O seu cabelo castanho,
Esse cabelo comprido,
(Que frio, que desconsolo!)
Deixa ficar-se pendente,
Em vez de, feito serpente,
Ir enroscar-se-lhe ao colo!
Camilo Pessanha
CLEPSIDRA E OUTROS POEMAS, Círculo de Leitores, Lda., Setembro de 1987
Não entristeça ninguém...
Ela estende o seu desdém
À sua própria beleza:
Quando, solta do vestido,
Sai da frescura do banho,
O seu cabelo castanho,
Esse cabelo comprido,
(Que frio, que desconsolo!)
Deixa ficar-se pendente,
Em vez de, feito serpente,
Ir enroscar-se-lhe ao colo!
Camilo Pessanha
CLEPSIDRA E OUTROS POEMAS, Círculo de Leitores, Lda., Setembro de 1987
Subscrever:
Mensagens (Atom)