semear tempestades
e assegurar que cresçam
foi para isso que os poetas foram feitos
esgrimir com a mais idónea
das espadas: a coragem
foi para isso que os poetas foram feitos
namorar a perfeição
e às vezes alcançá-la
foi para isso que os poetas foram feitos
A. M. Pires Cabral
[A Vista Desarmada, o Tempo Largo, Lisboa, Quetzal], in RESUMO a poesia em 2012, poemas escolhidos por Armando Silva Carvalho, José Alberto Oliveira, Luís Miguel Queirós, Manuel de Freitas , Edição Documenta, Lisboa, Março de 2013
29.3.13
26.3.13
[Há dias em que em ti talvez não pense]
1
Há dias em que em ti talvez não pense
a morte mata um pouco a memória dos vivos
é todavia claro e fotográfico o teu rosto
caído não na terra mas no fogo
e se houver um dia em que não pense em ti
estarei contigo dentro do vazio
Gastão Cruz
FOGO, Assírio & Alvim, Porto, Março de 2013
23.3.13
SEGUNDA PESSOA
Alguém diz tu. Alguém sem nome.
É a terra e o corpo e é o rasto de um sentido.
Alguém diz tu à imagem que se esgarça,
à certeza de uma longínqua razão.
Longe. O passado. Nomes, errados nomes de desejo.
Cego de insónia, nem lembrar te posso.
Nem mesmo em sonho saberia ver-te.
És só o pronome, tu, a ondular-me na boca,
norte magnético num desespero em surdina.
És a sílaba que dói a dor solar de um sentido.
A história avança na cabra-cega sem rostos,
e eu vivo em ti o tu mais só da minha vida.
Óscar Lopes
GAZETA literária, número especial quarto, outubro de dois mil e sete, nos vinte e cinco anos da associação dos jornalistas e homens de letras do porto
É a terra e o corpo e é o rasto de um sentido.
Alguém diz tu à imagem que se esgarça,
à certeza de uma longínqua razão.
Longe. O passado. Nomes, errados nomes de desejo.
Cego de insónia, nem lembrar te posso.
Nem mesmo em sonho saberia ver-te.
És só o pronome, tu, a ondular-me na boca,
norte magnético num desespero em surdina.
És a sílaba que dói a dor solar de um sentido.
A história avança na cabra-cega sem rostos,
e eu vivo em ti o tu mais só da minha vida.
Óscar Lopes
GAZETA literária, número especial quarto, outubro de dois mil e sete, nos vinte e cinco anos da associação dos jornalistas e homens de letras do porto
15.3.13
Este pov'assim
Este pov'assim
Aguenta tudo
Debita o banqueiro
E dobra o ministro
Um com ar cimeiro
Outro d'ar sinistro
Este povo anda
Para ser exacto
Com a cara à banda
Moído de facto
Abaixo de cão
Pior do que rato
© Domingos da Mota
Aguenta tudo
Debita o banqueiro
E dobra o ministro
Um com ar cimeiro
Outro d'ar sinistro
Este povo anda
Para ser exacto
Com a cara à banda
Moído de facto
Abaixo de cão
Pior do que rato
© Domingos da Mota
11.3.13
VELHO POETA QUE TENTA SER MODERNISTA
Também a ele subiram ganas de experimentar
as novas andas.
Alçou-se a elas
e anda com muito cuidado como uma cegonha.
É assombrosa a amplitude de vistas que adquiriu.
Até pode contar as ovelhas do seu vizinho.
Olav H. Hauge
Dropar i austavind, 1966
versão de Amadeu Baptista.
as novas andas.
Alçou-se a elas
e anda com muito cuidado como uma cegonha.
É assombrosa a amplitude de vistas que adquiriu.
Até pode contar as ovelhas do seu vizinho.
Olav H. Hauge
Dropar i austavind, 1966
versão de Amadeu Baptista.
8.3.13
MOEDA
Numa viela, em cima de cartão prensado,
Senta-se mais engelhada que os trapos.
Raspa com as unhas a cabeça do cão atormentado.
O fundo da garrafa serve de caçarola
E atira para aí as moedas.
(Ferrugentas são peças de coleccionadores.)
José Emílio-Nelson
PESA UM BOI NA MINHA LÍNGUA, Edições Afrontamento, 2013
Senta-se mais engelhada que os trapos.
Raspa com as unhas a cabeça do cão atormentado.
O fundo da garrafa serve de caçarola
E atira para aí as moedas.
(Ferrugentas são peças de coleccionadores.)
José Emílio-Nelson
PESA UM BOI NA MINHA LÍNGUA, Edições Afrontamento, 2013
3.3.13
DA LINGUAGEM DAS ÁRVORES E DO VENTO
8.
Cápsula
Tudo se foi embora. Já os sons adormeceram
ou retiraram-se já, como se diz do mar
que abandona a praia;
in-
suportável.
Ficou apenas
o áspero rumor distante da máquina
do mundo. Que funciona mal. Nada
solicita já a tua presença entretanto
inalcançável. A noite solidificou no espaço
entre o sagrado nome das coisas
quietas. Aquele rumor e esta noite são
o que te separa de ti -- frágil distância e
contudo demasiada.
Manuel Gusmão
PEQUENO TRATADO DAS FIGURAS, Assírio & Alvim, Fevereiro de 2013
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