sob o estigma da peste grisalha
Não vou somar aquilo que perdi,
sequer subtrair o que ganhei
ao muito que busquei e persegui
para atingir o pouco que apurei;
não vou patentear, mostrar aqui
o mapa dos caminhos que sonhei,
de tantos, tantos sítios que não vi
e que excedem de longe os que trilhei;
não vou apascentar os desenganos,
por muito defraudado que me sinta,
sequer ajoelhar perante os danos;
e mesmo que o tempo me desminta,
apesar do disfórico ferrete,
bem-vindos sejam os meus sessenta e sete
© Domingos da Mota
15.12.13
10.12.13
PUNHAL EXCELENTE
Já quase não há, o punhal excelente
com que a mim próprio me esventrei algumas vezes
para melhor me desentranhar em versos --
-- esses lícitos salpicos de lama,
essas coisas à toa, hossanas, ambições,
promessas, juras, astutas
ingenuidades: toda essa merda que há
dentro do poeta e com que ele gosta
de borrifar os outros. Para que
não se fiquem a rir.
E eis que agoniza: o gume rombo,
manchas inamovíveis de ferrugem,
incapaz de incisões, definitivamente
inoperacional o punhal excelente.
Paz ao seu aço.
A. M. Pires Cabral
gaveta do fundo, Edições Tinta-da-China, Lda., Lisboa, Novembro de 2013
com que a mim próprio me esventrei algumas vezes
para melhor me desentranhar em versos --
-- esses lícitos salpicos de lama,
essas coisas à toa, hossanas, ambições,
promessas, juras, astutas
ingenuidades: toda essa merda que há
dentro do poeta e com que ele gosta
de borrifar os outros. Para que
não se fiquem a rir.
E eis que agoniza: o gume rombo,
manchas inamovíveis de ferrugem,
incapaz de incisões, definitivamente
inoperacional o punhal excelente.
Paz ao seu aço.
A. M. Pires Cabral
gaveta do fundo, Edições Tinta-da-China, Lda., Lisboa, Novembro de 2013
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