VIII
(Sim, no século XX ainda se saqueiam
cidades. E nos séculos XXI, e XXII
e XXIII...)
Depois do saque
violaram a rapariga da sombra nua!
Ah! tenho vergonha do sol e da lua.
Vergonha das flores de sangue a chorar
(porque nem todo o orvalho cai do Ar).
Vergonha da sombra a seguir-me no chão
de rastos, como um bicho de solidão...
Vergonha das nuvens, das pedras que piso,
dos olhos das crianças a voarem de riso,
dos soluços das mães
(o pão que elas comem)
e dos uivos dos cães
na noite medonha
do fuzilamento
à luz dos archotes
-- com a sombra a tremer
no muro do vento.
(Mas o pior é que o Homem
tanto sujou a morte
que até tenho vergonha
de morrer.)
José Gomes Ferreira
POESIA - I, Portugália Editora, Lisboa, Outubro de 1969
Sem comentários:
Enviar um comentário