Só o descalço deixa marcas no caminho.
De lés a lés percorre a cidade, e ninguém o vê.
A todo o instante atravessa o medo, e ninguém o segue.
Em cada esquina estende a mão, e ninguém o louva.
Só o descalço deixa marcas no caminho.
Só o descalço deixa marcas no caminho.
Diante do sol inventa a manhã, e ninguém o ajuda.
À sombra da árvore abraça a tarde, e ninguém o entende.
Sem eira nem beira edifica a cidade, e ninguém o copia.
Só o descalço deixa marcas no caminho.
Só o descalço deixa marcas no caminho.
Até à loucura conhece as pedras, e ninguém o escuta.
À volta da cidade desdobra o canto, e ninguém o acolhe.
No fundo da noite rasga uma ferida, e veste-se de luz.
Só o descalço deixa marcas no caminho.
Mário Cláudio
Doze Mapas: Poesia Reunida, 1969-2019, prefácio António Carlos Cortez, Edição Glaciar, Lisboa, Outubro de 2019
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