Como ave de arribação
também o chapéu de palha
salta de Verão a Verão.
Francisco José Craveiro de Carvalho
As sapatilhas de Usain Bolt e outros tercetos, Companhia das Ilhas, Junho de 2015
18.6.24
16.6.24
[Ontem é passado]
Ontem é passadoo dia de hoje também acaba
a Primavera foge
Yosa Buson
PRIMEIRO AMOR e outros poemas, Editora Licorne, outubro de 2013
13.6.24
Tomamos a vila depois de um intenso bombardeamento
A criança loura
Jaz no meio da rua.
Tem as tripas de fora
E por uma corda sua
Um comboio que ignora.
A cara está um feixe
De sangue e de nada.
Luz um pequeno peixe
- Dos que bóiam nas banheiras -
À beira da estrada.
Cai sobre a estrada o escuro.
Longe, ainda uma luz doura
A criação do futuro...
E o da criança loura?
Fernando Pessoa
OBRA POÉTICA [Cancioneiro] I Volume, Organização, prefácio, cronologia e biografia de João Gaspar Simões, Círculo de Leitores, Lisboa, Janeiro de 1986
11.6.24
HEUREKA
Nosso dever acordados
ver tempo passar na pele
não cantar dogma aos ouvidos
do primeiro que passa sem ele
Nosso alibi sentir caos
possuir no sangue a senha
afastar de nós o vale
que treme olhando a montanha
Nosso corpo o mato as silvas
ter nos nervos explosão
tocar fartos mesmo quando
não temos flauta nem pão
Fernando Grade
Maria Alberta Menéres, E.M.de Melo e Castro, Antologia da Poesia Portuguesa 1940-1977, 2.º Volume, Moraes Editores, Lisboa 1979
ver tempo passar na pele
não cantar dogma aos ouvidos
do primeiro que passa sem ele
Nosso alibi sentir caos
possuir no sangue a senha
afastar de nós o vale
que treme olhando a montanha
Nosso corpo o mato as silvas
ter nos nervos explosão
tocar fartos mesmo quando
não temos flauta nem pão
Fernando Grade
Maria Alberta Menéres, E.M.de Melo e Castro, Antologia da Poesia Portuguesa 1940-1977, 2.º Volume, Moraes Editores, Lisboa 1979
10.6.24
Volta a mote
Pus meus olhos nũa funda,
E fiz um tiro com ela
Às grades dũa janela.
Ũa dama, de malvada,
Tomou seus olhos na mão
E tirou-me ũa pedrada
Com eles ao coração.
Armei minha funda então,
E pus os meus olhos nela:
Trape! quebro-lhe a janela.
Luís de Camões
LÍRICA, Terceiro volume das Obras Completas, Edição Círculo de Leitores, Lda., Setembro de 1984, 10.ª edição.
E fiz um tiro com ela
Às grades dũa janela.
Ũa dama, de malvada,
Tomou seus olhos na mão
E tirou-me ũa pedrada
Com eles ao coração.
Armei minha funda então,
E pus os meus olhos nela:
Trape! quebro-lhe a janela.
Luís de Camões
LÍRICA, Terceiro volume das Obras Completas, Edição Círculo de Leitores, Lda., Setembro de 1984, 10.ª edição.
1.6.24
O PÃO
Não é ainda um seio
mas quase. Na brancura.
Porém, onda de leite
a branca levedura.
Um mecanismo incerto
de ferro e madrugada.
A fome e o excesso
futuros. Na seara.
A fome e a carência
de sol(o) para a boca.
Não é ainda um campo
de areia. Ou terra solta.
Um campo descampado
um canto com bolor.
É arte que se move
minéria como a água.
Engenho de palato.
Alvéolo de pulmão.
Respira-se o exemplo
de sol. Oxigénio.
Não é ainda um círculo
branco por toda a mesa:
manchado na toalha
de sombra e aspereza.
Não é ainda uma ave
descendo sobre a pele:
um mecanismo triste
movendo a boca breve.
mas quase. Na brancura.
Porém, onda de leite
a branca levedura.
Um mecanismo incerto
de ferro e madrugada.
A fome e o excesso
futuros. Na seara.
A fome e a carência
de sol(o) para a boca.
Não é ainda um campo
de areia. Ou terra solta.
Um campo descampado
um canto com bolor.
É arte que se move
minéria como a água.
Engenho de palato.
Alvéolo de pulmão.
Respira-se o exemplo
de sol. Oxigénio.
Não é ainda um círculo
branco por toda a mesa:
manchado na toalha
de sombra e aspereza.
Não é ainda uma ave
descendo sobre a pele:
um mecanismo triste
movendo a boca breve.
Nuno Guimarães
Entre Sílabas e Lavas: poesia completa, Assírio & Alvim, Abril de 2024
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